1. INTRODUÇÃO
A intensificação do comércio entre as nações inaugurou um período de crescimento econômico e tecnológico sem precedentes na história humana, mas também trouxe efeitos colaterais indesejados. Dentre os desafios apresentados pela globalização da economia, as mudanças nas relações tributárias internacionais talvez representem um dos maiores problemas enfrentados pelos países nas últimas décadas.
Na busca pelo tão desejado investimento estrangeiro direto, as nações passaram a ser protagonistas de uma verdadeira guerra fiscal internacional, a fim de se tornarem atrativas para o capital privado nas decisões de alocação de novos investimentos. Essa necessidade induziu a utilização progressiva do tributo para fins extrafiscais, com o desenvolvimento de diversas políticas de incentivos fiscais, que alcançavam desde a concessão de redução de alíquotas ou base imponível de impostos até a criação dos chamados “paraísos fiscais”.
A competição internacional foi, em muitos aspectos, prejudicial para os países voltados para o comércio global, em especial para aqueles em fase de desenvolvimento, que viram suas receitas tributárias apresentarem desempenho aquém do esperado e desproporcional ao volume de investimento estrangeiro direto recebido.
A expressão corrida ao fundo do poço, cunhada pela Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico – OCDE, retrata bem o cenário caótico de uma comunidade internacional desarticulada sob o ponto de vista da tributação, bem como simbolizava a necessidade de mudança para um ambiente de maior cooperação fiscal entre os países.
Além disso, o crescimento das atividades econômicas transfronteiriças exigiu novos modelos de organização e funcionamento das empresas multinacionais, que passaram a se estruturar sob uma lógica de comercialização e distribuição global, e não mais local. Essa adaptação ao mundo globalizado também exigiu a mudança de paradigmas no planejamento tributação dessas corporações, a fim de otimizar os resultados do grupo econômico e, consequentemente, gerar mais valor aos seus acionistas.
No entanto, boa parte dessa reestruturação passou a ser baseada nas assimetrias fiscais existentes entre as legislações dos diversos países com os quais esses grupos exerciam seus negócios, muitas delas decorrentes diretamente do clima de competição fiscal referido. Também se tornou oportuno considerar as brechas existentes na imensa rede de tratados internacionais contra a dupla tributação, firmados em diferentes épocas e sob diferentes matizes políticas e econômicas.
O agravamento das preocupações das jurisdições fiscais quanto à manutenção de suas bases fiscais provocou uma ampla e coordenada reação em prol da harmonização tributária internacional, especialmente para combater a erosão das bases tributárias e o deslocamento artificial de lucros, provocados, sobretudo, pelo uso abusivo de procedimentos de otimização fiscal por parte das empresas multinacionais e pela concorrência fiscal entre os países.
Organizações internacionais, com destaque para a OCDE, empreenderam estudos e debates, com o fim específico de conter essas práticas fiscais prejudiciais, oferecendo soluções que se conciliassem com os interesses econômicos dos países no mercado global.
A mais eloquente e ampla iniciativa provocada por esse esforço multilateral foi o Projeto proposto pela OCDE em 2015, denominado Plano BEPS (Base Erosion and Profit Shifting). Ratificado por carca de 150 jurisdições ao redor do mundo, o Plano BEPS é composto por 15 ações que atacam o problema da erosão das bases fiscais e do deslocamento artificial de lucro sob diferentes abordagens e metodologias, endereçando recomendações e boas práticas aos países para a modelagem de normas internas e revisão de tratados internacionais relacionados com a tributação.
Esse esforço internacional demanda um enorme trabalho de harmonização e adequação normativa e de tratados internacionais, especialmente levando em conta a realidade e singularidade do sistema tributário de cada país, exigindo constante monitoramento e cooperação. O Brasil se insere nesse contexto e vem, aos poucos, tentando conciliar a legislação pátria com as recomendações e orientações das ações do Plano BEPS e modificar a sua rede de tratados internacionais relacionados contra a dupla tributação, no intuito de se adequar aos novos padrões internacionais de tributação.
No entanto, a primeira tentativa de internalizar no Brasil uma das ações do Projeto BEPS, ainda em 2015, não teve êxito. Trata-se da Ação nº 12 do BEPS, objeto do presente artigo, que aborda questões relacionadas com a introdução de normas de declaração obrigatória (mandatory disclosure rules) no ordenamento jurídico, introduzida no país por meio da Medida Provisória nº 685/2015, mas excluída logo em seguida, quando da conversão da MP em lei, pelo Congresso Nacional.
As normas de declaração obrigatória constituem o principal cerne do projeto encampado pela OCDE, que se dedica a conter planejamentos tributários agressivos, que abusam das brechas normativas para reduzirem ou eliminar a tributação de determinadas operações das empresas multinacionais.
As características peculiares do sistema tributário brasileiro, de matriz constitucional, dificultam a importação de normas dessa natureza. No entanto, a internalização de normas de declaração obrigatória de planejamentos fiscais agressivos, quando bem estruturadas e coerentes, contribuem tanto para aumentar a segurança jurídica dos contribuintes, especialmente das empresas e conglomerados econômicos, quanto para aumentar a transparência fiscal, preservando, assim, as bases tributárias de forma justa e coerente, desejo que é compartilhado pelas nações comprometidas com o Projeto BEPS.
Além disso, parece conveniente para o Brasil, porquanto participe ativamente da economia globalizada, harmonizar-se com os padrões internacionais de tributação, especialmente porque concorre à condição de membro da OCDE, cuja candidatura foi oficializada em 2017.
2. EXPERIÊNCIAS PRETÉRITAS DE MANDATORY DISCLOSURE RULES EM OUTROS PAÍSES
Com o aumento expressivo das práticas de evasão fiscal nas últimas décadas, em especial devido ao avanço da globalização econômica, o consequente incremento do comércio internacional (crossborder transactions) e da intensificação da concorrência fiscal internacional entre os países, diversas jurisdições fiscais ao redor do mundo começaram a buscar formas de combater a erosão de suas bases tributárias e, com isso, manter a integridade de seus sistemas fiscais.
Esse esforço não tardou a ganhar eco nas organizações internacionais multilaterais. A OCDE promoveu, em 2006, o OECD’s Forum on Tax Administration, com o objetivo de compartilhar conhecimento de desenvolvimentos e reformas em órgãos fazendários e enfrentar os desafios de não conformidade internacional com leis tributárias domésticas. Ao final do encontro, foi publicado uma declaração, conhecida como Seoul Statement, que manifestou a preocupação dos países signatários quanto ao crescimento dos esquemas de planejamentos tributários abusivos, destinados a reduzir ou eliminar a tributação prevista na legislação doméstica de cada país, e, com isso, recomendaram várias medidas de enfrentamento do problema, tanto em âmbito nacional quanto internacional, sob a lógica de que “to be fully effective, such national actions need to be reinforced by international actions” (OCDE, 2006, p. 3).
Dentre as recomendações apresentadas, foram identificadas quatro áreas nas quais deveriam ser iniciados ou intensificados estudos e iniciativas, sob a supervisão da OCDE, a seguir indicadas, em livre tradução:
(i) Continuar a desenvolver a lista de esquemas de planejamento tributário agressivo, a fim de identificar tendências e medidas para combater tais esquemas.
(ii) Examinar o papel dos intermediários fiscais (por exemplo, escritórios de advocacia e de contabilidade, outros consultores fiscais e instituições financeiras) em relação ao não cumprimento e à promoção de acordos de minimização de impostos inaceitáveis, com vistas a concluir um estudo até o final de 2007.
(iii) Expandir suas Diretrizes de Governança Corporativa de 2004 para dar maior atenção ao vínculo entre tributação e boa governança.
(iv) Melhorar o treinamento de funcionários fiscais em questões tributárias internacionais, incluindo o destacamento de funcionários de uma administração para outra. (OCDE, 2006, p. 4)
Respondendo a essas recomendações, vários países promoveram reformas legislativas e iniciativas administrativas para desencorajar o uso de procedimentos de otimização fiscal agressivos por parte de empresas multinacionais, especialmente quando o único ou principal propósito fosse a economia de tributos, por meio de arranjos que explorem as lacunas e brechas legais dos diversos países em que mantêm atividades econômicas.
Parte dessas reformas e iniciativas se concentrou na modelagem de normas de divulgação obrigatório de planejamentos fiscais. Ao promulgar essas normas, os governos identificaram a vantagem e conveniência de obter informação em tempo real e antecipadas sobre esquemas abusivos, que poderiam ser usadas para formular respostas legislativas capazes de gerenciar os riscos do planejamento tributário agressivo, direcionando recursos regulatórios escassos para a revisão de esquemas e acordos com maior probabilidade de envolver a evasão fiscal abusiva.
Combinando clareza, certeza, segurança jurídica e penalidades para contribuintes e promotores envolvidos em evasão fiscal abusiva, essas regras de divulgação obrigatória começaram a alterar a relação risco/recompensa para contribuintes e promotores envolvidos em esquemas de planejamento tributário abusivo, reduzindo a demanda e a oferta de esquemas dessa natureza.
Os Estados Unidos foram o primeiro grande país a introduzir normas relacionadas com o mandatory disclosure, sendo que as primeiras normas datam do ano de 1984, com destaque especial para o Internal Revenue Code – IRC (EUA, 2021), objeto do Capítulo 26 do US Code (Public Law 117-38).
De acordo com as regras vigentes nos EUA, os contribuintes que participam de transações sujeitas à declaração obrigatório, bem como os consultores que atuaram na organização, gestão, promoção, venda ou implementação de transações sujeitas ao reporte, devem divulgar essas transações por meio de declarações submetidas ao Internal Revenue Service – IRS. As transações sujeitas ao reporte, no teor da norma, incluem: “transações listadas” pelo IRS, arranjos fiscais oferecidos por consultores contratados em condições de confidencialidade, contratos de risco, condicionados à realização dos benefícios fiscais decorrentes da operação, e transações dedutíveis resultando em perdas acima dos limites de mercado.
Diversas disposições do Internal Revenue Code, com destaque para as Seções nº 6011, 6111, 6112, 6707, 6707A, 6662A e 6708, disciplinam os requisitos e condições para o reporte obrigatório, incluindo aqueles elementos básicos que a OCDE recomendaria posteriormente, por meio da Ação nº 12 do Plano BEPS (OCDE, 2015), quais sejam, quem deve reportar, quando deve reportar, o que deve ser reportado e quais são as consequências do non-compliance.
A Seção 6011 do IRC trata dos requisitos gerais da declaração obrigatória[1]. A Seção 6111 trata da revelação das transações reportáveis[2]. A Seção 6112 trata da obrigação de informar a relação de consultores relacionados com as transações reportáveis[3] As Seções 6662 e 6662A, que preveem multa de 20% sobre o imposto pago a menor ou o montante subdimensionado das transações declaradas, sofreram alterações para incluir os casos em que o propósito principal de transação, parceria, entidade, plano ou acordo for a elisão ou evasão fiscal, especialmente quando relacionados direta ou indiretamente com paraísos fiscais.
Por sua vez, as Seções 6707 e 6708 preveem multas aplicáveis em caso de violação da regra de disclosureprevista nas Seções 6111 6112, respectivamente, cuja multa, no primeiro caso, pode variar de US$ 50.000 (regra geral) até US$ 200.000 ou 50% da renda bruta, o que for maior (transações listadas na Seção 6707A), e, no segundo caso, é de US$ 10.000 para cada dia que ultrapassar o prazo limite.[4]
O Canadá introduziu regras semelhantes de registro de operações em paraísos fiscais a partir de 1989, inicialmente por meio do Tax Shelter Regime e, em seguida, por meio do Reporting of Tax Avoidance Transactions – RTAT, revisado em 2013, com requisitos de relatórios muito mais amplos, ambos incorporados ao Income Tax Act (Seções237.1, 237.3, 143.2 e 248) (CANADA, 1985).
A seção 237.1 do Income Tax Act tem como objetivo garantir que um agente de investimento de uma propriedade localizada em um paraíso fiscal (conforme definido na subseção 237.1) obtenha um número de identificação da Canada Revenue Agency – CRA por meio de um regime de registro, antes de oferecer o investimento para venda para potenciais investidores.[5]
Quando o requisito de registro não for atendido, a seção 237.1 (7.4) e (7.5) impõe consequências graves e punitivas para o promotor e investidores, na forma de multas que variam entre CAD$ 500,00 até 25% da quantia total envolvida no esquema fiscal, além da glosa de todas as deduções relativas ao investimento para o investidor.
A Seção 237.3[6] impõe a obrigação de declarar informações das respectivas transações para qualquer pessoa que, direta ou indiretamente, ainda que atuando como promotores ou consultores, obtenha benefício fiscal para si ou para terceiros por meio de transações consideradas reportáveis pelo Income Tax Act, em especial na Seção 245, prevendo multas elevadas em caso de descumprimento, conforme previsto nos itens (8), (9) e (10) da Seção 237.3.
Por sua vez, a Seção 143.2 trata do custo de investimentos em paraíso fiscal e a dedução de recurso-limitado em relação a doações, entendido este último como o montante principal não pago de qualquer dívida para o qual o recurso é limitado, seja imediatamente ou no futuro, seja absoluta ou contingente.
Por fim, a Seção 248 do Income Tax Act, em extensa lista, informa como devem ser interpretados os diversos conceitos, termos e expressões utilizados na norma, tais como empresa, pessoa, dividendos, propriedade, acionista, rendimento tributável, contribuinte e paraíso fiscal.
De acordo com o Relatório Final da Ação nº 12 do Plano BEPS (OCDE, 2015, p. 27), a CRA já negou mais de CAD$ 5,9 bilhões em pedidos de doações e reavaliou mais de 182.000 contribuintes que participaram desses paraísos fiscais. A CRA também revogou o status de caridade de 47 organizações que participaram desses esquemas e imputou penalidades contra seus promotores na extensão de CAD$ 137 milhões.
O Reino Unido implementou, em 2004, o Disclosure of Tax Avoidance Schemes – DOTAS, revisado em 2006, dentro do Finance Act 2004, Part 7, section 306 to section 319 (UK, 2004). De acordo com essas regras, os promotores (e, em certas circunstâncias, os usuários) de esquemas marcados (hallmarked schemes) são obrigados a declarar ao HM Revenue & Customs – HMRC informações sobre “arranjos fiscais” que permitam ou possam permitir que uma pessoa receba um benefício fiscal que represente o principal propósito do arranjo.
Logo de início, no item 2.1, o DOTAS apresenta, de forma simples e objetiva, os objetivos pretendidos pela norma, consistente em obter informações antecipadas sobre acordos fiscais e como eles funcionam, bem como informações sobre quem os usou. Em seguida, tratando do escopo e sumário da norma, informa, no item 2.3.2, que um acordo fiscal deve ser divulgado, mesmo se o HMRC já estiver ciente disso ou se não for considerado como elisão fiscal, especialmente quando: a) permita, ou possa permitir, que qualquer pessoa obtenha uma vantagem fiscal, b) a vantagem fiscal é, ou pode-se esperar que seja, o principal benefício ou um dos principais benefícios do acordo, e c) é um regime marcado por ser um regime fiscal que se enquadra na descrição normativa como tal (hallmarks) (UK, 2004).
Nos termos da norma, os regimes “marcados” são definidos por uma série de testes previstos naquela e incluem, dentre outros: a) arranjos em que o promotor pode razoavelmente exigir sigilo do beneficiário para facilitar o uso repetido; b) arranjos nos quais se espera que as vantagens fiscais sejam obtidas com a inclusão de um produto financeiro em que o promotor ou uma pessoa a ele relacionada se torna parte, onde o preço do produto financeiro difere significativamente de produtos financeiros semelhantes no mercado; c) arranjos que constituem produtos tributários padronizados; d) arranjos implementados por um promotor para mais de uma pessoa, cujo objetivo principal pode ser razoavelmente considerado como a provisão de perdas dedutíveis; e) arranjos para os quais se possa razoavelmente esperar que o promotor ou uma pessoa a ele ligada possa ser remunerada com base na vantagem fiscal esperada ou dependente do beneficiário obter a vantagem fiscal.
Quando o promotor ou contribuinte não apresentar a declaração exigida dentro dos prazos estipulados na legislação, ambos ficam sujeitos a penalidades que começam em £ 5.000 e aumentam em até £ 600 para cada dia em que a declaração não for entregue após a aplicação da penalidade inicial, como, por exemplo, a falta de entrega de declarações relacionadas com benefícios fiscais, como a prevista no Item 21.7 do DOTAS.[7]
Da mesma forma como consta nas recomendações do Relatório Final da Ação nº 12 do Plano BEPS (OCDE, 2015), a norma britânica consubstanciada no Disclosure of Tax Avoidance Schemes prevê de forma detalhada e extensa os elementos básicos que compõe as normas de mandatory disclosure, relacionados com quem deve informar (item 3), quando deve informar (item 13), o que deve ser informado (itens 4-12), como deve ser informado (item 14) e quais as consequências do non-compliance (item 21).
No Reino Unido, segundo as estatísticas de mandatory disclosure divulgadas pelo HMRC (UK, 2006), entre agosto de 2004 e setembro de 2014, cerca de 3.390 esquemas relacionados com impostos diretos e indiretos (VAT) foram divulgadas durante os primeiros dez anos iniciais de funcionamento de suas regras de divulgação obrigatória, sendo que, de uma média de 400 esquemas nos primeiros anos, as estatísticas caíram para cerca de 10 no último ano, demonstrando que as medidas implementadas naquele país foram eficientes e bem sucedidas, desencorajando o uso abusivo e prejudicial de esquemas de planejamento tributário agressivos.
Em Portugal, o regime de declaração obrigatória de arranjos fiscais abusivos iniciou por meio do Decreto-Lei n° 29/2008 (PORTUGAL, 2008), revogado em 2020, quando foi substituído pela Lei nº 26/2020. A exposição de motivos daquele Decreto-Lei já demonstrava o alinhamento do país lusitano com as melhores práticas internacionais acima referidas em matéria de normas de declaração obrigatória:
Entre as medidas que têm vindo a ser desenvolvidas noutros sistemas jurídicos, designadamente nos Estados Unidos da América, no Reino Unido e no Canadá, com vista a reforçar o combate à evasão fiscal, bem como à própria fraude, destaca-se a consagração de obrigações de comunicação, informação e esclarecimento à administração fiscal sobre esquemas ou actuações de planeamento fiscal agressivo que são propostos, promovidos e comercializa- dos por diversas entidades, genericamente apelidadas de intermediários fiscais. (p. 1)
A decreto-lei português, assim como as normas vistas até aqui, inspirou a iniciativa de combate à evasão fiscal internacional promovida pela OCDE, por meio da Ação nº 12 do Plano BEPS. Era específica para endereçar regras para declaração obrigatória, cujo escopo constava no seu art. 1º: “(…) estabelece deveres de comunicação (…) sobre esquemas (…) que tenham como finalidade, exclusiva ou predominante, a obtenção de vantagens fiscais, em ordem ao combate ao planeamento fiscal abusivo” (PORTUGAL, 2008).
O art. 2º do Decreto-Lei n° 29/2008 definia o âmbito de aplicação da norma, atingindo todos os planejamentos tributários que impliquem, de qualquer modo, em vantagens e benefícios fiscais. A seguir, os artigos 3º, 4º, 5º e 6º, definiam detalhadamente o que entendiam por planejamento tributário, esquemas fiscais, promotores e exclusões, dando uma feição de completude da norma e, com isso, contribuindo para a segurança jurídica tanto da autoridade fiscal quanto dos contribuintes.
O art. 7º definia quando deveria ser feita a comunicação (dia 20 do mês seguinte em que o esquema ou planeamento fiscal tenha sido proposto pela primeira vez) e a qual era a autoridade competente (Diretor-Geral de Impostos). Por sua vez, o art. 8º tratava do que deveria ser informado, exigindo a descrição detalhada do planejamento fiscal adotado, a sua base legal e os dados dos seus promotores, se fosse o caso.
O art. 10º, combinado com o art. 7º, definia quem estava obrigado a prestar a declaração, compreendendo o contribuinte beneficiário do esquema fiscal, no primeiro caso, e o promotor desse esquema, no segundo caso. Por fim, o art. 17 previa as penalidades aplicáveis em caso de non-compliance, constituídas de multas pecuniárias que variavam entre €500 e €100.000, para empresas e pessoas coletivas em geral, e €250 e €50.000, para pessoas físicas, a depender da infração cometida.
O decreto-lei português ainda tratava de outras questões administrativas, procedimentais e legais, que denotavamo seu caráter de norma completa, como a proteção ao comunicante (art. 12º), a publicação periódica de estatísticas (art. 14), a garantia de sigilo fiscal (art.16) e a revisão periódica da norma (art. 23) (PORTUGAL, 2008).
Em 2020, o Decreto-Lei nº 29/2008 foi revogado e substituído pela Lei nº 26/2020 (PORTUGAL, 2020), diante da necessidade de alinhamento de Portugal com a Diretiva (UE) 2018/822 (EU, 2018) do Conselho da União Europeia, que alterou a Diretiva 2011/16/UE do referido Conselho para introduzir, no âmbito da União Europeia, normas uniformes e atualizadas de intercâmbio automático de informações fiscais, de declaração obrigatória de planejamentos fiscais transfronteiriços, dentre outras.
O Conselho da União Europeia expressou, nos considerandos da Diretiva (UE) 2018/822, as preocupações que constituem objeto das modificações que estavam sendo implementadas na legislação da União Europeia, em direta sintonia com as recomendações da Ação nº 12 do Plano BEPS da OCDE:
Il est par conséquent essentiel que les autorités fiscales des États membres obtiennent des informations complètes et pertinentes sur les dispositifs fiscaux à caractère potentiellement agressif. De telles informations leur permettraient de réagir rapidement contre les pratiques fiscales dommageables et de remédier aux lacunes par voie législative ou par la réalisation d’analyses des risques appropriées et de contrôles fiscaux.
(…) la Commission a été amenée à engager des initiatives relatives à la communication obligatoire d’informations sur les dispositifs de planification fiscale à caractère potentiellement agressif, qui s’inspirent de l’action 12 du projet de l’OCDE concernant l’érosion de la base d’imposition et le transfert de bénéfices (BEPS).[8] (EU, 2018, p. 2)
A nova lei portuguesa manteve o escopo do revogado decreto-lei, mas ampliou e atualizou os objetos de tutela legal, trazendo novas definições, tratando de operações com bens intangíveis e do teste de propósito principal, promovendo o intercâmbio automático de informações fiscais e regulando aspectos transfronteiriços, como critérios de residência, contribuinte relevante e estabelecimento permanente (PORTUGAL, 2020). A Lei estabelece e regulamenta a obrigação de declarar à autoridade fiscal planejamentos tributários e operações internas ou transfronteiriças que tenham relevância fiscal, nos termos da norma, e que ofereçam risco de evasão fiscal.
Dessa forma, a legislação portuguesa sobre regras de declaração obrigatória, tanto por meio do revogado Decreto-Lei n° 29/2008 quanto pela atual Lei nº 26/2020, atende de forma satisfatória às preocupações manifestadas pelos países membros da OCDE na Declaração de Seul, em 2006, bem como preenche todos os elementos básicos e princípios recomendados pela OCDE no Relatório Final da Ação nº 12 (OCDE, 2015).
Em 2011, com o relatório Tackling Aggressive Tax Planning through Improved Transparency and Disclosure(OCDE, 2011, p. 13-14), a OCDE avaliou a evolução das normas de mandatory disclosure entre os seus países membros e, referindo-se expressamente aos modelos adotados nos Estados Unidos, Canada, Reino Unido e Portugal, destacou que as normas têm se concentrado fortemente na conduta dos promotores dos esquemas e planejamentos tributários. Além disso, baseado nos modelos implementados até então, o relatório sistematiza os elementos básicos que devem compor normas dessa natureza, que serão utilizados alguns anos depois para a modelagem da Ação nº 12 do Plano BEPS:
All mandatory disclosure regimes have to address a number of design questions which determine their scope and application. At a very basic level, the regimes need to specify who has to report, what must be reported and when the disclosure must be made. The regime will also need to manage the expectations and explain the consequences of making disclosures for taxpayers. The regimes further need to spell out the consequences of non-disclosure (OCDE, 2011, p. 14).
3. A IMPLEMENTAÇÃO DA AÇÃO Nº 12 DO PLANO BEPS NO BRASIL
Desde que ratificou o Plano BEPS, em 2013, o Brasil vem trabalhando intensamente para adequar o seu marco regulatório fiscal aos novos padrões internacionais, em especial por meio da implementação progressiva das recomendações objeto das ações do Plano BEPS, da OCDE. Por estar inserido no contexto da globalização econômica e, evidentemente, ter interesse na luta pela preservação das suas bases fiscais, o país vem internalizando na legislação pátria algumas das recomendações do Plano BEPS e modificando a sua rede de tratados internacionais contra a bitributação.
Como destaca Torres (2019, p 24), atualmente, o Brasil concentra seus esforços na melhoria e atualização dos seus atos normativos, com especial foco no objetivo de colocar em vigor as Ações nº 5, 13, 14 e 15, mas tem trabalhado também na atualização da sua rede de tratados contra a dupla tributação, a fim de adequá-los às recomendações do Plano BEPS.
Esse esforço esbarra, no entanto, nas características singulares do ordenamento jurídico-tributário brasileiro, de matriz constitucional e com elevada complexidade, impondo enormes desafios para uma efetiva harmonização com aqueles padrões globais de tributação. A própria OCDE reconhece que cada país possui liberdade para implementar certar ações do Plano BEPS (OCDE, 2015, p. 9), de acordo com suas peculiaridades normativas e, por isso, cabe às diferentes jurisdições fiscais avaliar a melhor conveniência e oportunidade para promover as necessárias mudanças na sua legislação interna e na sua rede de tratados contra a dupla tributação.
Segundo Gomes (2016, p.8), “ainda que seja do interesse do Brasil adequar-se às práticas internacionais, ou, ao menos, neutralizar eventuais efeitos negativos decorrentes das incompatibilidades existentes, não é prudente uma simples internalização”. E arremata dizendo que a conveniência de internalizar ou não as recomendações do BEPS demandam um amplo e ponderado estudo sobre a compatibilidade delas com o Sistema Tributário Constitucional brasileiro.
Subsistem, ainda, preocupações legítimas quanto à preservação dos interesses econômicos do país na atração do investimento estrangeiro direto. Tratando do princípio da cooperação subjacente às ações do Plano BEPS, Schoueri (2016, p. 49-50) salienta que ela deve ocorrer também entre os países, e não apenas entre fisco e contribuintes, a fim de preservar “os interesses e as legítimas pretensões dos países em desenvolvimento, em sua maioria países importadores de capital”.
Conforme explica Torres (2019, p.24), o Brasil deverá enfrentar todos esses desafios para se adequar ao cenário de transparência fiscal internacional proposto pela OCDE, especialmente no que tange à necessidade de adequação do sistema tributário interno, para o atingimento da transparência global e integridade do sistema financeiro e tributário internacional.
O maior desafio parece estar em equilibrar ao máximo os objetivos de harmonização normativa internacional com a preservação das competências tributárias do país, já que a implementação de certas recomendações da OCDE pode gerar o indesejado efeito de deslocamento da competência tributária para outros países, como em certos casos de regras de preços de transferência, estabelecimentos permanentes e instrumentos contratuais e entidades híbridos.
Como destaca Tavares (2016, p. 10), o Projeto BEPS visa o aprimoramento do sistema tributário internacional, por meio do combate às práticas fiscais prejudiciais, ao uso abusivo de procedimentos de otimização fiscal e à competição fiscal internacional, e não a redistribuição radical do poder de tributar.
Um bom exemplo do esforço brasileiro de adequação normativa é o projeto realizado em conjunto entre a OCDE e a Receita Federal do Brasil – RFB sobre preços de transferência, na tentativa de promover o alinhamento do Brasil com os padrões internacionais sobre a matéria ditados pela OCDE, como as Diretrizes relativas aos Preços de Transferência (OCDE/RFB, 2019) e as próprias Ações nº 8, 9 e 10 do Plano BEPS. Segundo o relatório produzido em 2019 no âmbito desse projeto conjunto, através da análise da estrutura legal de preços de transferência, a iniciativa conjunta tem como objetivo:
Com base na análise dos pontos fortes e das fragilidades desse quadro legal, possíveis opções foram exploradas para o alinhamento do Brasil com a norma internacionalmente aceita da OCDE, usando-se as Diretrizes da OCDE relativas aos Preços de Transferência e outras recomendações da OCDE como referência.[9] (OCDE/RFB, 2019, p. 14)
No entanto, como salienta Torres (2019, p. 32), em alguns aspectos, as normas brasileiras são mais eficientes para a realidade nacional do que aquelas sugeridas pela OCDE, tornando menos atrativas as recomendações desta, como é o caso das normas voltadas para a regulação fiscal de empresas controladas e coligadas no exterior, valendo-se dos princípios do jurisdictional approach e do transactional approach, a fim de caracterizar o elemento abusivo e identificar o objeto das atividades exercidas e a natureza da renda, respectivamente.
Em outros casos, a estrutura normativa brasileira simplesmente difere dos padrões recomendados pelo Plano BEPS, dificultando a adesão aos seus padrões e recomendações. Como destaca Gomes (2016, p. 7), “resta nítido que o país tem seu sistema tributário construído sobre bases e premissas próprias, muitas vezes distintas daquelas sobre as quais se debateram as propostas do Projeto BEPS”, concluindo que, devido a essas distinções, as recomendações da OCDE podem ou não ser compatíveis com o sistema brasileiro (p. 8).
Machado e Júnior (2019, p.279) explicam que, na Ação nº 3 do Plano BEPS, o conceito de entidade Controlled Foreign Companies – CFC é mais amplo do que o da lei brasileira – Lei nº 12.973/2014, alcançando estruturas como trusts, por exemplo, em que pese a lei nacional não limitar o conceito de CFC aos riscos inerentes ao Plano BEPS. No entanto, a Lei nº 12.973/2014 traz regras específicas para Controladas e Coligadas, com tributação automática da renda, ainda que de forma presumida. Comentando essa lei, Gomes et al (2016, p.198) afirmam que “não há similar no mundo, tendo o legislador pátrio estabelecido regime fiscal que tributa toda a renda auferida no exterior, independentemente de qualquer critério ou teste”.
Por outro lado, as normas nacionais de controle dos preços de transferência foram estruturadas de forma distinta do padrão oferecido pelas Ações nº 8, 9 e 10 do Plano BEPS, que são fundadas nos princípios da agregação de valor e do arm’s lenght, a partir de critérios de substância e transparência, dificultando a adoção do padrão internacional. A complexidade das Diretrizes das regras de preços de transferência da OCDE e, por consequência, o seu alto custo de administração, também desestimulou o país a adotar o padrão oferecido pelo Plano BEPS (TAVARES, 2016, p. 12).
Como lembra Torres (2019, p. 39), o Brasil, antes do Plano BEPS, já possuía medidas específicas e eficientes para controlar os preços de transferência, especialmente sobre as commodities, como é o caso da Lei no 9.430/1996 e da Lei nº 12.715/2012. Segundo o autor:
As regras sobre preços de transferência alcançaram elevado nível de precisão na legislação tributária brasileira para conter os abusos, após toda a evolução do seu modelo, que não se utiliza com preponderância do princípio arm’s lenght, em dissonância com os regimes propostos pela OCDE.
O Brasil também tentou introduzir no ordenamento jurídico pátrio as recomendações da Ação nº 12 do Plano BEPS, relacionadas com as regras de declaração obrigatória de procedimentos fiscais (mandatory disclore rules), o que ocorreu por meio da publicação no Diário Oficial da União, em 22/07/2015, da Medida Provisória – MP nº 685/2015 (BRASIL, 2015b), no âmbito do Programa de Redução de Litígios (PRORELIT), instituindo a Declaração de Informações e Operações Relevantes nos artigos 7º ao 12 da referida norma.
De acordo com o art. 7º da referida MP (BRASIL, 2015b), o conjunto de operações realizadas no ano-calendário anterior que envolva atos ou negócios jurídicos que acarretem supressão, redução ou diferimento de tributo, nos casos que enumera, deverá ser declarado pelo sujeito passivo à Secretaria da Receita Federal do Brasil até o dia 30 de setembro de cada ano fiscal.
Pela dicção da norma, os contribuintes estão sujeitos a tal declaração os contribuintes quando: a) os atos ou negócios jurídicos praticados não possuírem razões extratributárias relevantes; b) a forma adotada não for usual, utilizar-se de negócio jurídico indireto ou contiver cláusula que desnature, ainda que parcialmente, os efeitos de um contrato típico; ou, c) tratar de atos ou negócios jurídicos específicos previstos em ato da Secretaria da Receita Federal do Brasil.
O art. 8º dispõe sobre o tratamento dispensado para a declaração envolvendo atos ou negócios jurídicos ainda não ocorridos, a qual será recebida como consulta, na forma dos artigos 46 a 58 do Decreto nº 70.235/1972, que trata do processo administrativo fiscal. Por sua vez, o art. 9º da MP 685/2015 trata dos efeitos para as declarações tempestivas que tiverem seus efeitos tributários não reconhecidos pela RFB, hipótese em que o contribuinte pode pagar à vista ou de forma parcelada os tributos devidos, acrescidos de juros e sem incidência de multa.
O art. 10 remete a ato administrativo da RFB a regulamentação de critérios concernentes à forma, ao prazo e às condições de apresentação da declaração obrigatória. Já o art. 11 dispõe sobre a ineficácia da declaração, nos casos que enumera.
Por fim, o art. 12 da MP 685/2015 prevê as consequências do non-compliance, estabelecendo que o descumprimento do disposto no art. 7º ou a ocorrência de alguma das situações previstas no art. 11 caracteriza omissão dolosa do sujeito passivo com intuito de sonegação ou fraude e os tributos devidos serão cobrados acrescidos de juros de mora e da multa de 150%.
No entanto, a tentativa brasileira de positivação de normas de mandatory disclosure nos moldes recomendados pela OCDE na Ação nº 12 do Plano BEPS não vigorou por muito tempo. Na conversão da MP 685/2015 em lei, o Congresso Nacional excluiu da norma as disposições relacionadas com a Declaração de Informações e Operações Relevantes, objeto dos artigos 7º ao 12, sendo, então, promulgada a Lei de Conversão nº 13.202/2015 (BRASIL, 2015a), publicada em 09/12/2015, sem aquelas regras.
Às vésperas da votação em plenário, a Comissão Mista do Congresso Nacional encarregada de analisar o projeto de lei de conversão da MP nº 685/2015 apresentou o Parecer nº 90, de 2015-CN (BRASIL, 2015e, p. 10), onde advertia que o texto da MP contradiz o escopo desenhado na sua própria exposição de motivos, fomentando a insegurança jurídica na relação entre o Fisco e os contribuintes. Durante a sessão de votação da referida Lei de Conversão, no plenário da Câmara dos Deputados, o Deputado Federal Luiz Carlos Hauly (PSDB-PR) argumentou que:
Não é possível aprovar uma inconstitucionalidade como essa em medida provisória; fazer com que o contribuinte, já lesado, que está passando por uma brutal crise econômica, com as mais altas taxas de juros do mundo, com a mais alta carga tributária de consumo do mundo, arque com isso. (BRASIL, 2015d, p.54)
A Exposição de Motivos da MP (BRASIL, 2015c) sugeriu que a declaração obrigatória possuía aderência às recomendações da Ação nº 12 do Plano BEPS da OCDE, conforme consta do seguinte trecho:
A segunda medida proposta estabelece a necessidade de revelação de estratégias de planejamento tributário, que visa aumentar a segurança jurídica no ambiente de negócios do país e gerar economia de recursos públicos em litígios desnecessários e demorados. A ausência de informações completas e relevantes a respeito das estratégias de planejamentos tributários nocivos é um dos principais desafios enfrentados pelas administrações tributárias no mundo. O acesso tempestivo a tais informações oferece a oportunidade de responder rapidamente aos riscos de perda de arrecadação tributária por meio de fiscalização ou de mudança na legislação.
5. Nesta linha, o Plano de Ação sobre Erosão da Base Tributária e Transferência de Lucros (Plano de Ação BEPS, OCDE, 2013), projeto desenvolvido no âmbito da OCDE/G20 e que conta com a participação do Brasil, reconheceu, com base na experiência de diversos países (EUA, Reino Unido, Portugal, África do Sul, Canadá e Irlanda), os benefícios das regras de revelação obrigatória a administrações tributárias. Assim, no âmbito do BEPS, há recomendações relacionadas com a elaboração de tais regras quanto a operações, arranjos ou estruturas agressivos ou abusivos.
6. O principal objetivo dessa medida é instruir a administração tributária com informação tempestiva a respeito de planejamento tributário, além de conferir segurança jurídica à empresa que revela a operação, inclusive com cobrança apenas do tributo devido e de juros de mora caso a operação não seja reconhecida, para fins tributários, pela RFB. Ademais, destaca-se que a medida estimula postura mais cautelosa por parte dos jurisdicionados antes de fazer uso de planejamentos tributários agressivos.
No entanto, o texto da MP relacionado com a declaração obrigatória não evidenciava tal aderência, tratando do tema em reduzidas linhas, com superficialidade e pouca clareza, sendo de se supor exatamente o contrário, como defende Fonseca (2016, p. 50-51), ou seja, que o texto da MP colidia com as recomendações da OCDE, no que tange às mandatory disclosure rules, apesar das justificativas apresentadas na sua exposição de motivos.
Ribeiro (2016, p. 65-66) sustenta essa falta de clareza sobre o conteúdo da declaração obrigatória prevista na norma brasileira, denunciando que “qualquer operação que viesse a ser imputada com os rótulos de abuso de forma e da ausência de propósito negocial deveriam ser informadas”. Seguindo a mesma linha de raciocínio, Fonseca (2016, p. 51) complementa, dizendo que essa falta de clareza poderia provocar o descumprimento da obrigação de revelar informações, sujeitando o contribuinte à imposição de penalidades, em especial as elevadas multas previstas na norma e a caracterização de crime fiscal.
Daí a conclusão de Barbosa (2019, p. 501) de que o modelo de mandatory disclosure rules trazido pela MP nº 685/2015 é incompatível com as recomendações oferecidas pela Ação nº 12 do Plano BEPS, de modo que a tentativa brasileira gerava insegurança jurídica e violava o princípio da legalidade.
Essa insegurança jurídica aparecia logo no art. 7º, como assevera Fonseca (2016, p. 51), onde a versão brasileira das mandatory disclosure rules gerava angústia aos contribuintes ao positivar critérios e conceitos imprecisos, tais como “razões extratibutárias relevantes” e “forma adotada não usual”, dotando a autoridade fiscal de critérios subjetivos para julgar o acerto do planejamento tributário escolhido. Barbosa (2019, p. 494) chega mesmo a duvidar da constitucionalidade de tais critérios e conceitos, questionando “o que são razões tributárias relevantes” e “formas não usuais”, e conclui dizendo que:
Neste ponto, a MP nº 685/2015 revela-se absolutamente incompatível com a Constituição Federal, pois a utilização de conceitos indeterminados e sequer positivados restringem o âmbito de aplicação do princípio da legalidade, que, na condição de norma finalística, exige a delimitação de um estado ideal de coisas a ser buscado por meio de comportamentos necessários a essa realização.
Com relação. à presunção de dolo instituída pelo art. 12 da MP nº 685/2015, Fonseca (2016, p. 51) adverte que a norma “violou recomendação expressa do Relatório Final da Ação nº 12, segundo o qual a elisão fiscal em potencial e as operações de planejamento tributário divulgadas sob regimes de divulgação compulsória não deveriam dar origem a maiores preocupações sobre autoincriminação”.
Isso porque o descumprimento da obrigação de revelar as informações exigidas pelo art. 7º da MP 685/2015, segundo entende Barbosa (2019, p. 499-500), enquanto obrigação acessória, não pode resultar em criminalização do contribuinte nem na invalidação do planejamento tributário e consequente aplicação de sanção. Nesse aspecto, configurava-se mais um distanciamento da norma brasileira com os padrões recomendados pela OCDE. O Relatório Final (OCDE, 2015, p. 56), ao tratar das consequências do non-compliance, adverte que as informações declaradas pelo contribuinte não significam necessariamente evasão fiscal, assim como a divulgação de tais informações não implica na validade do planejamento tributário declarado.
Merece destaque, ainda, o fato de a MP nº 685/2015 ter desconsiderado completamente a regulação de transações transfronteiriças, que constitui o cerne das preocupações da OCDE, como adverte Fonseca (2016, p. 52-53), bem como não ter incluído no dever de declarar os intermediários e promotores dos arranjos fiscais, demonstrando outro desencontro da norma com as recomendações da Ação nº 12. Verifica-se, também, como entende Barbosa (2019, p. 501), um enorme abismo entre um dos principais objetivos subjacentes ao Projeto BEPS da OCDE, que é a coesão e pacificação do sistema tributário internacional, já que o modelo brasileiro instituído pela MP 685/2015 era claramente voltado para fins meramente arrecadatórios.
Em que pese a exposição de motivos da Medida Provisória tenha se inspirado na Ação nº 12 do Plano BEPS, a forma como foi materializada a norma caracterizava mais uma tentativa de, por via transversa, regulamentar a cláusula geral antielisiva objeto do parágrafo único do art. 116 do Código Tributário Nacional, que ainda pende de regulamentação desde a rejeição da MP nº 66/2002 (RIBEIRO, 2016, p.65).
Analisando sob o prisma dos elementos básicos recomendados pelo Relatório Final da Ação nº 12 do Plano BEPS, o art. 7º da MP 685/2015 indicava quem deveria prestar as informações (embora imponha essa obrigação a todos os contribuintes cujas operações se enquadrem nos incisos do citado dispositivo) e quando as informações deveriam ser prestadas, fixando data limite para informação anual em 30 de setembro. No entanto, a norma era omissa quanto ao aspecto procedimental, deixando de prever como e o que deveria ser declarado, caracterizando mais um distanciamento das recomendações da OCDE, conforme ressalta Barbosa (2019, p. 499).
Mesmo quanto aos elementos básicos presentes na norma brasileira, não é possível dizer que se amoldam de forma adequada às recomendações do Plano BEPS. Quanto ao aspecto pessoal (quem deve declarar), embora o Relatório Final da Ação nº 12 seja expresso quanto a inclusão dos mesmos na modelagem da norma (OCDE, 2015, p. 19), a MP nº 685/2015 deixou de fora atores importantes no que tange aos planejamentos tributários agressivos e aos consequentes riscos de BEPS, que são os consultores e promotores desses esquemas de otimização fiscal.
Já quanto ao aspecto temporal (quando deve declarar), embora o art. 7º estabelecesse uma data limite anual para o envio global da declaração e dispusesse o art. 10 que caberia à RFB fixar critérios temporais específicos, a norma brasileira deixou de observar o principal objetivo que contorna o modelo de mandatory disclosure proposto pela OCDE, que é fornecer informações antecipadas à autoridade fiscal sobre determinados planejamentos tributários esquemas e seus usuários, a fim de permitir a rápida reação aos riscos de evasão fiscal (OCDE, 2015, p. 19).
O objetivo das regras de divulgação obrigatória é fornecer à administração tributária informações antecipadas e eficientes sobre determinados planejamentos tributários esquemas e seus usuários. A determinação adequada de quem e quando deve declarar é, portanto, a chave para atingir esse objetivo.
Num exemplo hipotético, um planejamento tributário reportável implementado em 1º de outubro estaria sujeito à divulgação obrigatória somente um ano depois, no dia 30 de setembro do ano seguinte. Assim, quanto à observância dos elementos básicos do designe normativo, a MP 685/2015 também não oferecia adequada compatibilidade com os padrões de mandatory disclosure rules da Ação nº 12 do Plano BEPS.
Comparado com os modelos já consolidados em outros países de normas de revelação obrigatória de planejamentos fiscais potencialmente nocivos, em especial aqueles acima estudados e que estão em pleno vigor nos Estados Unidos, no Reino Unido, no Canadá e em Portugal, percebe-se facilmente que a tentativa brasileira consubstanciada na MP nº 685/2015 carecia de densidade normativa e, acima de tudo, de aderência aos princípios que têm norteado o direito tributário internacional nos últimos anos.
Além dos elementos básicos para o adequado desenho normativo, o Relatório Final da Ação nº 12, lastreado sobretudo nas boas práticas sobre a matéria observadas naqueles países, apresenta os princípios básicos que devem nortear a elaboração de normas de declaração obrigatória, tais como clareza e facilidade de entendimento, equilíbrio entre os custos de conformidade e os benefícios obtidos, eficácia para alcançar os objetivos pretendidos e identificar com precisão os esquemas relevantes e, ainda a utilização eficaz das normas (OCDE, 2015, p. 19-20).
A tentativa desastrada de introdução na legislação brasileira de normas de declaração obrigatória de planejamentos fiscais chamou a atenção para a necessidade de tratar a questão de forma responsável e eficiente, garantindo uma transição harmoniosa e segura para os padrões internacionais de tributação. Gomes (2016, p.8), a esse respeito, assevera que:
Logo, ainda que seja de interesse do Brasil adequar-se às práticas internacionais, ou, ao menos, neutralizar eventuais efeitos negativos decorrentes das incompatibilidades existentes, não é prudente uma simples internalização das mais recentes diretrizes. Pelo contrário, é necessária a realização de um estudo quanto à compatibilidade ou não das aludidas recomendações com o Sistema Tributário Constitucional brasileiro, além de outras considerações de ordem política e econômica, para que se possa decidir de forma prudente quanto à conveniência de internalizá-las, ou mesmo quanto aos possíveis mecanismos de que o país dispõe para neutralizar efeitos negativos decorrentes da manutenção das disparidades de regramento.
É o mesmo entendimento manifestado por Torres (2019, p. 29), que defende a necessidade de implementação no Brasil das recomendações da Ação nº 12 do Plano BEPS, mas admite que precisam ser melhor adaptadas para a realidade nacional.
Normas de mandatory disclosure são complexas, como adverte Batista (2016, p. 116), que questiona se o Brasil estaria preparado para implementá-las. Normas dessa natureza costumam exigir um elevado nível de maturidade regulatória e normalmente pressupõem a consolidação de padrões mínimos de cooperative compliance, entendido como dimensão qualitativa da relação Fisco/contribuinte. Essa conclusão fica clara nos estudos iniciais da OCDE sobre o combate ao BEPS.
No relatório Addressing Base Erosion and Profit Shifting, a OCDE apela às jurisdições fiscais para que implementem ações imediatas para fortalecer o compliance tributário (OCDE, 2013b, p. 53), deixando claro que essas ações são pré-requisitos importantes para a criação de um ambiente fiscal justo e cooperativo, bem como para a positivação de normas de caráter coercitivo:
The Forum of Tax Administrations gathers the Tax Commissioners of all OECD and G20 countries. The Forum will meet in Moscow in May 2013. It is expected that the Tax Commissioners will focus on and communicate on their actions to improve tax compliance, which is a pre-requisite for a fair tax environment. They are invited in particular to draw on the work developed by the OECD in the area of aggressive tax planning, with more than 400 schemes included in the aggressive tax planning directory.[10]
O mesmo entendimento é manifestado pela OCDE em alguns estudos que antecederam o Projeto BEPS, como, por exemplo, o relatório Co-operative Compliance: A Framework: From Enhanced Relationship to Co-operative Compliance (OCDE, 2013c, p. 11), publicado em 2013: “There is a need to restore trust and confidence in the relationship between business and tax administrations. Drawing on the experiences of 24 countries, this report sets out how a co-operative compliance model can help to do that”.[11]
Comentando sobre as melhores práticas recomendadas pela OCDE para a implementação da Ação nº 12 do Plano BEPS, Tavares (2016, p. 34) ressalta a diferença de ambiente entre o Brasil e os países que possuem um sofisticado marco regulatório e uma forma cultura de cooperação em matéria fiscal:
É certo que tais práticas comumente são partes de uma política mais ampla, que enfatiza a cooperação e a construção de confiança na relação fisco-contribuinte. Ambientes regulatórios mais sofisticados na prevenção e resolução de disputas (…) São ambientes bem mais evoluídos e distintos do que se observa no Brasil.
Reconhecendo a necessidade de implementação no Brasil de normas de mandatory disclosure, Tavares (2016, p. 34-35) apresenta algumas propostas para facilitar o caminho em direção ao padrão oferecido pelas recomendações da Ação nº 12 do BEPS, por meio da implementação padrões de cooperative compliance, que chama de Cumprimento Cooperativo de Obrigações Tributárias. Segundo ele, esses padrões precisam observar os seguintes princípios:
(p) Opcionalidade na adesão a um novo programa de Cumprimento Cooperativo de Obrigações Tributárias (“CCT”) destinado aos maiores contribuintes, que incorporará o PRORELIT e que qualificará o contribuinte a determinadas vantagens determinadas por lei, ao passo que vedará a adesão a futuros programas de redução de litígios que impliquem em redução de passivos tributários (e.g. não eligibilidade a futuro REFIS). Para os optantes ao CCT, impor a obrigatoriedade de Declaração de Posições Incertas a que se refere a Ação 12 e listar operações relevantes de modo exemplificativo e não exaustivo, permitindo aos contribuintes informarem outras operações relevantes e posições incertas;
(q) Conceder de modo permanente aos inscritos no CCT a não incidência de multas para as operações declaradas tempestivamente (e.g. na declaração do primeiro ano-calendário em que surtirem efeitos fiscais) e instituir a cobrança de juros compostos à taxa SELIC para os casos em que a cobrança for considerada legítima após ampla defesa do contribuinte através de contencioso administrativo-fiscal perante o CARF;
(r) Instituir sistema de transação que permita reduzir tal contencioso, considerando a probabilidade de êxito dos contribuintes nas discussões administrativas;
(s) Instituir sistema de consultas mutuamente vinculantes (inclusive em matéria de transfer pricing, i.e.APAs) para os contribuintes participantes no CCT e incrementar o acesso dos casos destes contribuintes que forem objeto de consulta aos procedimentos MAP dos ADTs.
No entanto, para a eficácia dessas medidas, é fundamental que a formação de uma cultura de cooperação fiscal vá além da mera retórica legal e se revista de verdadeira política de Estado, fortemente baseada na confiança e coerência nas relações entre contribuinte e Estado (e não apenas com o Fisco), como entende Almeida (2017, p. 80), com verdadeira mudança de comportamento nos dois polos da relação tributária, a fim de evitar o sentimento de injustiça e discriminação.
4. CONCLUSÃO
A complexidade do Sistema Tributário brasileiro parece impor certos desafios para a implementação mais ampla do conjunto das ações do Plano BEPS no país. Aspectos peculiares do sistema constitucional-tributário nacional, como a sua ampla carga axiológica dedicada à tributação, aliados à rigidez do princípio da soberania estatal que ainda impera em nossos tempos, também parecem oferecer certa resistência não apenas à implementação consistente das recomendações da OCDE no país como, de forma geral, ao fortalecimento da cooperação internacional em matéria fiscal.
Gomes (2016, p. 2) destaca que a implementação de ações como as do Plano BEPS nesse cenário é “extremamente audaciosa”, exigindo profundo estudo sobre os possíveis impactos na legislação pátria tanto para os contribuintes, no dirigismo de seus negócios internacionais, quanto para as autoridades fiscais, no sentido de preservação de direitos e garantias.
Parte dessas dificuldades podem estar ligadas à própria estrutura do sistema tributário brasileiro, ou porque esse sistema já oferece tratamento adequado e mais eficaz a determinadas questões abordadas pela OCDE, ou porque tais recomendações conflitam com as premissas e fundamentos lógico-normativos do sistema, ou, ainda, porque o país não conta com uma cultura de cooperação fiscal suficientemente madura e generalizada.
Em todos os casos, em que pese a inexistência de normas compatíveis com as recomendações do BEPS, a cultura jurídico-tributária, de matriz constitucional, combinada com as caraterísticas peculiares do processo legislativo, dificultam sobremaneira a sua plena implementação no Brasil.
Como lembra Torres (2019, p. 27), o Brasil possui um modelo normativo na esfera tributária com elevado grau de constitucionalização, distinguindo-se, nesse aspecto, de muitos países. Segundo o autor, essa característica coloca em nível de norma fundamental os direitos e garantias dos contribuintes, dentre eles os princípios da legalidade, da irretroatividade, da proibição do confisco, da não cumulatividade, da capacidade contributiva e da imunidade, tutelados pelo Supremo Tribunal Federal, que considera inconstitucional qualquer lei, tratado ou ato infraconstitucional que tentem limitá-los, restringi-los ou alterá-los. E conclui o autor, dizendo que:
Desse modo, todas as disposições da Convenção da AEOI ou dos planos de ação do BEPS devem passar por uma rigorosa análise de compatibilidade com a Constituição, diante da multiplicidade de direitos fundamentais e limitações ao poder de tributar existentes. Pontualmente, poderá haver, em certos casos, impossibilidade de internalização de alguma das propostas de cada plano de ação, como ocorreu com a primeira tentativa de intridução do Plano de Ação 12 – Mandatory Disclosure Rules, que foi rejeitado pela Câmara de Deputados.
A experiência malsucedida com a tentativa de internalização das recomendações da Ação nº 12 do BEPS, por meio da MP nº 685/2015, demonstra o erro na implementação de medidas precoces e mal estruturadas, sujeitando a graves riscos não apenas os contribuintes, mas também à integridade do sistema tributário nacional.
Em que pese a necessidade, no contexto de uma economia globalizada, de adequação aos padrões fiscais internacionais para o enfrentamento do BEPS, não parece ser adequada a queima de etapas no processo de evolução e maturação da cultura jurídico-tributária nacional, sob pena de perda da eficácia das normas implementadas e, consequentemente, dos objetivos almejados com a sua implementação (BATISTA, 2016, p. 116).
A versão brasileira de mandatory disclosure rules ignorou solenemente a maioria das recomendações da OCDE, bem como aspectos próprios do ordenamento jurídico nacional, como ressalta Fonseca (2019, p. 55). Por outro lado, Samaha (2016, p. 104-105) assevera que a OCDE desconsiderou os distintos interesses existentes ente os países desenvolvidos e em fase de desenvolvimento no combate à evasão fiscal, de tal forma que estes últimos precisam avaliar se a criação de normas de declaração obrigatória, nos moldes propostos pela OCDE, se mostra adequada e aderente à sua política fiscal.
Para a introdução de mandatory disclosure rules no Brasil, é necessária a compreensão dos aspectos singulares da realidade brasileira demanda um amplo e multilateral trabalho de pesquisa, conjugando toda a extensão e alcance das medidas propostas pela OCDE com os critérios de eficiência e segurança jurídica de sua adoção pelo Brasil.
Deve levar em conta, ainda, aspectos de soberania, constitucionalismo, cultura de conformidade fiscal e políticas econômica e fiscal, a fim de preservar as bases fiscais do país ao mesmo tempo em que permite o desenvolvimento econômico sustentável, baseado na cooperação fiscal, o que inseriria verdadeiramente o país na vanguarda das boas práticas de tributação internacional.
Fonseca (2019, p. 54-55) adverte, ainda, que, com apego à carga principiológica da Constituição Federal brasileira, o método de desclassificação administrativa de planejamentos fiscais, utilizado pela MP nº 685/2015 como técnica de combate à evasão fiscal, encontrou dificuldades de implementação no país porque se revelou um mero instrumento voltado para o aumento da arrecadação tributária, por meio da coerção e intimidação dos contribuintes.
Na mesma linha de raciocínio, Barbosa (2019, p. 501) destaca que o modelo trazido pela MP nº 685/2015 “ostenta um caráter primordialmente arrecadatório, sem maiores preocupações com a transparência e a melhoria da relação entre o Fisco e os Contribuintes; muito pelo contrário – já que promove a insegurança e impõe o já conhecido terror fiscal”.
E foi com base nessa constatação que Ribeiro (2016, p. 68) concluiu tratar-se a tentativa brasileira de introdução de normas de declaração obrigatória como “uma tentativa malograda de regulamentação do parágrafo único do artigo 116 do Código Tributário Nacional, ainda que por via oblíqua”, com completo desapego com os objetivos almejados pela OCDE na Ação nº 12 do Plano BEPS, muito embora a exposição de motivos da MP nº 685/2015 afirmasse o contrário.
No entanto, apesar dos equívocos representados pela tentativa da MP nº 685/2015, há um certo consenso doutrinário de que as regras de mandatory disclosure deverão ser introduzidas no Brasil (BARBOSA, 2019, p.502), mas com maior aderência aos padrões internacionais, sobretudo no que diz respeito à “melhoria da relação entre Fisco e contribuintes, com qualidade do atendimento, orientações e fomento à espontaneidade” (TORRES, 2019, p. 29-42).
Nesse sentido, Barbosa, citando Derzi, apresenta cinco sugestões de medidas que poderiam pavimentar o caminho para um nível ótimo de melhoria das relações entre Fisco e contribuinte, baseadas no XXº Relatório do Conseil des Impôts da França (França, 2002), cujo tema era exatamente a relação entre os contribuintes e a Administração Fiscal na França, quais sejam: a) aumento do grau de informação e de conhecimento do contribuinte; b) aumento do grau de segurança das informações; c) melhoria da qualidade da norma jurídica; d) reforço aos direitos e garantias dos contribuintes e segurança jurídica; e, e) maior procedimentalização da administração tributária (2019, p. 506-507).
Sobre o tema, o citado relatório do Conseil des Impôts francês apresenta eloquentes fundamentos para o desenvolvimento dessas práticas de aperfeiçoamento da relação fiscal, como destacado no seguinte trecho:
Au cours des années récentes, elles [les administrations fiscales] se sont toutefois engagées dans une mutation culturelle visant à fonder sur une plus grande confiance réciproque le consentement des contribuables à payer leurs impôts. Le Conseil des impôts a voulu contribuer à cette évolution en cherchant comment continuer à améliorer les relations entre l’administration et les contribuables sans, pour autant, réduire l’efficacité de l’administration fiscale. Au fur et à mesure que ses travaux ont progressé, le Conseil a constaté que, loin d’être antinomiques, la recherche de l’efficacité administrative et celle de l’amélioration des relations entre les contribuables et leur administration fiscale constituent des objectifs remarquablement complémentaires[12] (França, 2002, p. 259).
Nesse sentido, são igualmente oportunas as sugestões normativas e políticas apresentadas por Tavares (2016, p. 34-35), incluindo a implementação de modelos de cooperative compliance, que chama de Cumprimento Cooperativo de Obrigações Tributárias, como condição sine qua non para o desenvolvimento de uma cultura fiscal mais elevada no país, preparando o caminho para o adequado acolhimento das recomendações da Ação nº 12 do Plano BEPS. O autor arremata o assunto, sustentando que:
Os programas de cooperative compliance têm resultados excelentes para os países que os instituíram. E em países evoluídos a transação é parte fundamental destes programas (este instituto é muito importante, por exemplo, no Japão). Mesmo não havendo transação que reduza o valor principal, é comum que a divulgação de posições incertas ocorra no exterior no contexto de programas de cooperative complianceque, no mínimo, eliminam as multas como estímulo para a cooperação fisco-contribuinte.
O próprio Relatório Final da Ação nº 12 do Plano BEPS (OCDE, 2015, p. 22) indica que o sucesso na introdução de um regime de divulgação obrigatória depende de outros fatores, dentre os quais a disponibilidade de ferramentas alternativas de divulgação e conformidade, como o cooperative compliance:
In particular, the additional intelligence on tax planning behaviour that a tax administration obtains under a mandatory disclosure regime will depend on the breadth and effectiveness of other information disclosure, such as co-operative compliance and rulings regimes, that collect substantially the same information.[13]
Reforçando essa recomendação da OCDE, em prol da implementação de programas de cooperative compliance, Almeida (2017, p. 68) entende que:
Cabe, portanto, aos Estados que intentarem se ajustar mais rapidamente às mudanças em curso na ordem econômica internacional a estruturação das bases de um sistema de conformidade fiscal mais cooperativo e menos conflitivo entre fisco e contribuinte.
No Brasil, os últimos anos têm experimentado um crescimento de iniciativas de conformidade, tanto por meio do law enforcement quanto do cooperative compliance. No primeiro caso, a instituição de normas como a Lei nº 9.613/1998[14], a Lei nº 12.846/2013[15], a Lei 13.303/2016[16] e a Resolução CMN nº 4.595/2017, do Banco Central do Brasil[17] estabeleceram, em nível federal, alguns dos marcos regulatórios que atualmente reforçam e dão efetividade em programas de compliance tanto no âmbito da administração pública direta quanto indireta, incluindo, neste último caso, as empresas públicas e as sociedades de economia mista.
No âmbito dos seus Estados, o Brasil viu nascer uma série inédita de normas instituindo programas de integridade e compliance, que alcançam não apenas a conduta dos gestores públicos, mas também impõem deveres de conformidade às empresas privadas que se relacionarem com o Poder Público estadual (contratos, convênios, concessões, etc.), como, por exemplo, a Lei nº 20.489/2019, do Estado de Goiás, a Lei nº 4.730/2018, do Estado do Amazonas, a Lei Complementar nº 1.320/2018, do Estado de São Paulo, e a Lei nº 17.715/2019, do Estado de Santa Catarina.
A chave para o sucesso dessas medidas de law enforcement parece estar na execução desses programas e medidas, ou seja, numa efetiva mudança de cultura dos agentes públicos, não sendo suficiente a mera retórica legal ou a designação de pessoas para responderem pelas áreas de integridade e compliance nos órgãos e entidades públicas. Segundo Almeida (2017, p. 71), é preciso “capacitá-los a operar com um sistema diferente, que migra da tradicional abordagem repressiva para outra proativa”.
A autoridade fiscal deverá estar comprometida com o contribuinte nesse esforço de mudança de cultura, conquistando a sua confiança por meio de “boas práticas – como conduta transparente e amigável, aconselhamento tempestivo e oportuno – capazes de reduzir controvérsias e evitar despesas desnecessárias por parte dos contribuintes” (ALMEIDA, 2017, p. 73).
Por outro lado, as iniciativas de cooperative compliance ainda são tímidas no Brasil. Sem prejuízo dos programas e ações já promovidos, o país ainda demanda pelo fortalecimento de uma efetiva cultura de cooperação fiscal na relação entre o Estado e o contribuinte, que não se limite à mera retórica legal.
Algumas iniciativas por parte do Poder Público contribuem para o atingimento desse objetivo, como, por exemplo, o manual Programa de Integridade – Diretrizes para Empresas Privadas, da Controladoria-Geral da União – CGU, que apresenta orientações para auxiliar as empresas a construir ou aperfeiçoar programas dessa natureza, e o programa de Monitoramento de Grandes Contribuintes, da Receita Federal do Brasil, que incentiva o cumprimento voluntário de obrigações fiscais por meio de abordagens de conformidade, aumento da percepção de riscos e alertas de desconformidade.
Empresas com negócios no Brasil, especialmente as de médio e grande porte, também passaram a implementar programas de integridade e cooperative compliance, impulsionadas tanto pela necessidade de fortalecimento da governança corporativa quanto por razões de estratégia de marketing e concorrência.
Como explica Blok (2018, p. 2), a instituição de programas de integridade nas empresas privadas tem como objetivo melhorar a governança, a imagem da empresa, a gestão de riscos e a relação com clientes, acionistas e stakeholders.
O desenvolvimento de um ambiente confiável de conformidade e integridade nas empresas, na visão de Brito (2018, p. 65), é o pressuposto fundamental para a eficácia de programas de cooperative compliance, estimulando a cooperação de todos na construção de uma nova cultura, tanto nas relações internas quanto externas.
Em linhas conclusivas, Almeida (2017, p. 68) assevera que:
O êxito de um programa de co-operative compliance requer do fisco, motivação e vontade suficientemente grandes para promover profunda modificação comportamental em seus agentes; e do contribuinte, a implantação de estruturas de controle interno capazes de fomentar governança corporativa sob valores éticos e abertos à sociedade e ao Estado. Por essa via, as empresas poderão atingir maiores graus de conformidade fiscal, estimulados, ainda, pelo avanço da confiança nas relações com o próprio fisco.
Esse parece ser o caminho seguro para criar as condições necessárias à implementação de normas de mandatory disclosure no Brasil, em especial aquelas recomendadas pela OCDE na Ação nº 12 do Plano BEPS (OCDE, 2015, p. 22), ou seja, o desenvolvimento prévio ou concomitante de fortes e consistentes padrões de cooperação na relação entre a autoridade fiscal e os contribuintes.
O erro materializado na tentativa veiculada pela MP nº 685/2015, no que tange à sua tentativa de introduzir tais normas no país, decorreu da adoção de medidas precipitadas, no sentido de prescindir do prévio fortalecimento do ambiente de cooperative compliance, e de caráter essencialmente arrecadatório (BARBOSA, 2019, p. 505), desperdiçando a oportunidade de aprimoramento da tributação, com maior alinhamento com as boas práticas fiscais internacionais.
No entanto, esse erro não impede ou inviabiliza nova tentativa de implementação de normas de declaração obrigatória de planejamentos fiscais agressivos. O sistema tributário brasileiro pode recepcionar normas dessa natureza, tanto nas operações internas quanto externas, possibilitando à autoridade fiscal o conhecimento prévio dos modelos de otimização fiscal pretendido pelo contribuinte.
No entanto, a integração ao ordenamento jurídico pátrio deve observar estritamente os princípios e os elementos básicos constantes das recomendações da OCDE na Ação nº 12 do Plano BEPS, inclusive no que se refere ao estímulo e fortalecimento de programas voltados para ama autêntica cooperação fiscal, que inclua, além de contribuintes, os próprios agentes fiscais, a fim de fortalecer a cultura de boas práticas, integridade e conformidade em matéria fiscal.
Conclui-se, por fim, aproveitando as considerações de Ribeiro (2016, p. 83), com o entendimento de que “agora é hora de aprender com os erros e começar tudo de novo, com mais inteligência e redobrada vontade”, com aderência às recomendações da OCDE e às boas práticas internacionais em matéria tributária, inclusive no que diz respeito ao fomento de uma forte cultura de cooperação fiscal, com efetiva mudança de comportamento da autoridade fiscal e dos contribuintes.
A introdução de maduras de normas de declaração obrigatória, bem como o desenvolvimento dessa cultura cooperativa, são necessárias e importantes para inserir o país na vanguarda da tributação internacional, harmonizando o nosso sistema tributário com as melhores práticas mundiais em matéria fiscal, baseados na transparência, substância e coerência.
Dessa forma, permeado por um verdadeiro espírito de cooperação fiscal, o Brasil poderá experimentar, ao mesmo tempo, um avanço em termos de maturidade fiscal e de conformidade com a lei, com benefícios claros para o Estado, por meio da redução das perdas com a arrecadação tributária e dos custos inerentes à fiscalização, para os contribuintes, com um melhor gerenciamento do risco fiscal e a redução dos custos de conformidade, e, sobretudo, para a sociedade, na medida em que, dispondo de mais recursos, o Estado poderá executar suas diversas políticas públicas, promovendo o crescimento econômico e sustentável, com justiça social.
REFERÊNCIAS
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[1] Chapter 26 U.S. Code § 6011 – General requirement of return, statement, or list. (a) General rule: When required by regulations prescribed by the Secretary any person made liable for any tax imposed by this title, or with respect to the collection thereof, shall make a return or statement according to the forms and regulations prescribed by the Secretary. Every person required to make a return or statement shall include therein the information required by such forms or regulations.
[2] Chapter 26 U.S. Code § 6111 – Disclosure of reportable transactions: (a) In general. Each material advisor with respect to any reportable transaction shall make a return (in such form as the Secretary may prescribe) setting forth: (1) information identifying and describing the transaction, (2) information describing any potential tax benefits expected to result from the transaction, and (3) such other information as the Secretary may prescribe. Such return shall be filed not later than the date specified by the Secretary. (b) Definitions. For purposes of this section: (1) Material advisor. (A) In general. The term “material advisor” means any person: (i) who provides any material aid, assistance, or advice with respect to organizing, managing, promoting, selling, implementing, insuring, or carrying out any reportable transaction, and (ii) who directly or indirectly derives gross income in excess of the threshold amount (or such other amount as may be prescribed by the Secretary) for such aid, assistance, or advice. (B) Threshold amount. For purposes of subparagraph (A), the threshold amount is: (i) $50,000 in the case of a reportable transaction substantially all of the tax benefits from which are provided to natural persons, and (ii) $250,000 in any other case. (2) Reportable transaction. The term “reportable transaction” has the meaning given to such term by section 6707A(c). (c) Regulations. The Secretary may prescribe regulations which provide: (1) that only 1 person shall be required to meet the requirements of subsection (a) in cases in which 2 or more persons would otherwise be required to meet such requirements, (2) exemptions from the requirements of this section, and (3) such rules as may be necessary or appropriate to carry out the purposes of this section.
[3] Chapter 26 U.S. Code § 6112 – Material advisors of reportable transactions must keep lists of advisees, etc.: (a) In general. Each material advisor (as defined in section 6111) with respect to any reportable transaction (as defined in section 6707A(c)) shall (whether or not required to file a return under section 6111 with respect to such transaction) maintain (in such manner as the Secretary may by regulations prescribe) a list: (1) identifying each person with respect to whom such advisor acted as a material advisor with respect to such transaction, and (2) containing such other information as the Secretary may by regulations require. (b) Special rules (1) Availability for inspection; retention of information on list. Any person who is required to maintain a list under subsection (a) (or was required to maintain a list under subsection (a) as in effect before the enactment of the American Jobs Creation Act of 2004): (A) shall make such list available to the Secretary for inspection upon written request by the Secretary, and (B) except as otherwise provided under regulations prescribed by the Secretary, shall retain any information which is required to be included on such list for 7 years. (2) Lists which would be required to be maintained by 2 or more persons The Secretary may prescribe regulations which provide that, in cases in which 2 or more persons are required under subsection (a) to maintain the same list (or portion thereof), only 1 person shall be required to maintain such list (or portion).
[4] Chapter 26 U.S. Code § 6707 – Failure to furnish information regarding reportable transactions: (a) In general. If a person who is required to file a return under section 6111(a) with respect to any reportable transaction: (1) fails to file such return on or before the date prescribed therefor, or (2) files false or incomplete information with the Secretary with respect to such transaction, such person shall pay a penalty with respect to such return in the amount determined under subsection (b).
Chapter 26 U.S. Code § 6708. Failure to maintain lists of advisees with respect to reportable transactions: (a) Imposition of penalty (1) In general. If any person who is required to maintain a list under section 6112(a) fails to make such list available upon written request to the Secretary in accordance with section 6112(b) within 20 business days after the date of such request, such person shall pay a penalty of $10,000 for each day of such failure after such 20th day. (2) Reasonable cause exception. No penalty shall be imposed by paragraph (1) with respect to the failure on any day if such failure is due to reasonable cause.
[5] Section 237 (1) Every individual (other than a trust) who was resident or employed in Canada at any time in a taxation year and who files a return of income under Part I for the year, or in respect of whom an information return is to be made by a person pursuant to a regulation made under paragraph 221(1)(d), shall, (a) on or before the first day of February of the year immediately following the year for which the return of income is filed, or (b) within 15 days after the individual is requested by the person to provide his Social Insurance Number, apply to the Canada Employment Insurance Commission in prescribed form and manner for the assignment to the individual of a Social Insurance Number unless the individual has previously been assigned, or made application to be assigned, a Social Insurance Number.
[6] An information return in prescribed form and containing prescribed information in respect of a reportable transaction must be filed with the Minister by (a) every person for whom a tax benefit results, or would result but for section 245, from the reportable transaction, from any other reportable transaction that is part of a series of transactions that includes the reportable transaction or from the series of transactions; (b) every person who has entered into, for the benefit of a person described in paragraph (a), an avoidance transaction that is a reportable transaction; (c) every advisor or promoter in respect of the re- portable transaction, or in respect of any other trans- action that is part of a series of transactions that includes the reportable transaction, who is or was entitled, either immediately or in the future and either absolutely or contingently, to a fee in respect of any of those transactions (…) (d) every person who is not dealing at arm’s length with an advisor or promoter in respect of the re- portable transaction and who is or was entitled, either immediately or in the future and either absolutely or contingently, to a fee that is referred to in paragraph (c).
[7] Tradução livre: 21.7 The user penalty – tax advantage: A scheme user who fails to comply with a section 313 obligation to report a scheme reference number and related information (on a return or separately, as prescribed in the Information Regulations) is from 26 March 2015 liable to a penalty of: £5,000 per scheme (for example, each scheme to which the failure relates) for a first occasion; £7,500 per scheme on the second occasion within 3 years (whether or not it relates to the same scheme involved in the previous occasion); £10,000 per scheme on the third and subsequent occasions (whether or not the failure relates to schemes involved in a previous occasion).
[8] Tradução livre: É, portanto, essencial que as autoridades fiscais dos Estados-Membros obtenham informações completas e relevantes sobre regimes fiscais potencialmente agressivos. Essas informações lhes permitiriam reagir rapidamente contra práticas fiscais prejudiciais e corrigir lacunas através da legislação ou através da realização de análises de risco e auditorias fiscais adequadas. (…) a Comissão foi levada a iniciar iniciativas relacionadas com a comunicação obrigatória de informações sobre mecanismos de planeamento fiscal potencialmente agressivos, que se inspiram na ação 12 do projeto da OCDE relativa à Erosão de base e transferência de lucros (BEPS).
[9] Texto original: Based on the assessment of its strengths and weaknesses, possible options were explored for Brazil’s alignment with the OECD internationally accepted transfer pricing standard, using the OECD Transfer Pricing Guidelines and other relevant OECD guidance as a reference for the analysis.
[10] Tradução livre: O Fórum das Administrações Tributárias reúne os Comissários Tributários de todos os países da OCDE e do G20. O Fórum se reunirá em Moscou em maio de 2013. Espera-se que os Comissários Tributários se concentrem e se comuniquem sobre suas ações para melhorar a conformidade tributária, que é um pré-requisito para um ambiente tributário justo. Eles são convidados, em particular, a basear-se no trabalho desenvolvido pela OCDE na área de planejamento tributário agressivo, com mais de 400 esquemas incluídos no diretório de planejamento tributário agressivo.
[11] Tradução livre: É necessário restaurar a confiança nas relações entre empresas e administrações fiscais. Com base nas experiências de 24 países, este relatório define como um modelo de conformidade cooperativa pode ajudar a fazer isso.
[12] Tradução livre: Nos últimos anos, porém, elas [as administrações fiscais] embarcaram em uma mudança cultural com o objetivo de estabelecer uma maior confiança mútua na disposição dos contribuintes em pagar seus impostos. O Conselho Fiscal quis contribuir para esse desenvolvimento, buscando como continuar a aprimorar as relações entre a administração e os contribuintes sem, no entanto, diminuir a eficiência da administração tributária. No decorrer dos seus trabalhos, o Conselho constatou que, longe de serem contraditórios, a procura de eficiência administrativa e de melhoria das relações entre os contribuintes e a sua administração fiscal constituem objetivos notavelmente complementares.
[13] Tradução livre: Em particular, a inteligência adicional sobre o comportamento de planejamento tributário que uma administração tributária obtém ao abrigo de um regime de divulgação obrigatória dependerá da amplitude e eficácia de outras fontes de divulgação, como a conformidade cooperativa e os regimes de decisões, que coletam substancialmente as mesmas informações.
[14] Dispõe sobre os crimes de “lavagem” ou ocultação de bens, direitos e valores; a prevenção da utilização do sistema financeiro para os ilícitos previstos nesta Lei; cria o Conselho de Controle de Atividades Financeiras – COAF, e dá outras providências.
[15] Dispõe sobre a responsabilização administrativa e civil de pessoas jurídicas pela prática de atos contra a administração pública, nacional ou estrangeira, e dá outras providências.
[16] Dispõe sobre o estatuto jurídico da empresa pública, da sociedade de economia mista e de suas subsidiárias, no âmbito da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.
[17] Dispõe sobre a política de conformidade (compliance) das instituições financeiras e demais instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil.
Sobre o autor: Fabiano Ramalho é Advogado, especialista em Direito Tributário pela FGV, mestre em Direito pela UFSC e consultor jurídico em direito empresarial, tributário, societário, portuário e regulatório, é membro-fundador da Associação de Estudos Tributários de Santa Catarina – ASSET/SC, foi CEO do Porto de São Francisco do Sul (SC) e Diretor de Assuntos Regulatórios e Jurídicos da SC Participações e Parcerias S/A – SCPar (SC).
Fabiano Ramalho
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